Na Boa Vista o “sufoco já passou” dois anos após o início da pandemia em Cabo Verde

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A ilha da Boa Vista registou há dois anos os primeiros casos de covid-19 em Cabo Verde, afetando turistas, e ainda vive com as consequências da sua ausência, embora o autarca local admita que o “sufoco já passou”.

“O turismo é efetivamente a atividade económica da ilha. Passamos momentos terríveis do ponto de vista da covid-19. Com o abrandamento de casos e reabertura do turismo percebemos realmente que houve uma certa dinâmica em termos de emprego”, começou por explicar em entrevista à Lusa o presidente da Câmara Municipal da Boa Vista, Cláudio Mendonça.

Cabo Verde confirmou em 19 de março de 2020 o primeiro caso de covid-19 no arquipélago, um turista inglês de férias na Boa Vista, que viria a morrer quatro dias depois, além de outro inglês e um holandês. Rapidamente o Governo colocou a ilha em quarentena, isolada de todas as outras, enviando militares e equipas médicas, e obrigando a população a ficar em casa.

“Na altura, no momento da covid-19, vivemos momentos de muito sufoco devido ao desemprego. Uma ilha em que antes da covid-19 o número de turistas era de quase 250 mil para de repente passar a ter nada, nenhum turista, hotéis fechados, aeroporto fechado, e as pessoas que trabalhavam e estavam diretamente com o turismo irem para o desemprego. Isso realmente foi dramático para a ilha e para as pessoas que vivem cá, para as situações de falta de rendimento”, explicou o autarca.

Os isolamentos dos casos crescentes de covid-19 eram feitos, ainda em março e abril de 2020, nos próprios hotéis da ilha e só progressivamente os turistas abandonavam a Boa Vista, em voos de repatriamento e após o período de recuperação.

Paralelamente, o turismo parou por completo na ilha e só um ano depois, em 24 de março de 2021, o Aeroporto Internacional Aristides Pereira voltou a receber voos internacionais. Nesse dia, chegou à Boa Vista um voo ‘charter’ da companhia italiana Neos, proveniente de Milão, numa retoma da procura turística que acelerou no final do ano, com o regresso do operador TUI e a reabertura dos hotéis do grupo espanhol RIU.

“Com a entrada de novo dos turistas é ver as pessoas irem de novo para o trabalho. É só vir à cidade de Sal Rei logo de manhã para ver o número de autocarros que se deslocam aos hotéis para levarem os trabalhadores, que antes, no período da covid, vinham onde? À Câmara Municipal solicitar empregos”, recordou Cláudio Mendonça.

A retoma a que se assiste na Boa Vista, ilha com cerca de 10 mil habitantes, sobretudo trabalhadores do turismo de outras ilhas, “veio facilitar” a vida da Câmara e do seu presidente, “face ao problema social que se evidenciava”.

“Houve um aumento considerável de pedidos de emprego [na Câmara]. Estranhamente, porque as pessoas aqui na Boa Vista estavam focadas nos hotéis, no turismo, nos transportes turísticos, na cadeia turística. Na Câmara Municipal são mais serviços administrativos e de saneamento, praticamente. Com a covid-19 e com o fecho da atividade turística, a Câmara Municipal passou a ser a principal empregadora, mesmo que fosse por um período bastante curto”, recordou.

Com o aeroporto aberto e “níveis satisfatórios” de ocupação nos principais hotéis da ilha, Cláudio Mendonça mostra-se aliviado com a falta de interesse na procura de emprego na autarquia: “Com a retoma, viu-se também a retirada das pessoas da Câmara Municipal, para irem para a atividade turística, porque lá têm melhores rendimentos, estão mais bem enquadrados do ponto de vista profissional”.

Cabo Verde recebeu em 2019 um recorde de 819.308 turistas, 45,5% nos hotéis da ilha do Sal e 29,4% na Boa Vista, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística cabo-verdiano, num setor que representa 25% do Produto Interno Bruto (PIB) e do emprego do arquipélago, mas a procura global caiu cerca de 70% em 2020, devido à pandemia de covid-19.

Aquelas duas ilhas concentram também a maioria das 284 unidades hoteleiras que funcionavam em Cabo Verde antes da pandemia, então com uma oferta oficial em todas as ilhas superior a 21 mil camas. No Sal, com 30 unidades hoteleiras, a oferta era de 9.571 camas, enquanto nas 24 unidades na Boa Vista a oferta ascendia a 6.395 camas.

“Muitas das pessoas que estavam cá saíram da ilha, foram para as suas ilhas, porque não havia emprego, não havia como viver e o custo de vida na ilha da Boa Vista é efetivamente bastante caro”, contou ainda o autarca.

Agora, referiu, outros setores de atividade estão a retomar, com o regresso dos turistas: “Há já alguma atividade na ilha. Até as construções, daí que se nota efetivamente alguma retoma, alguma tranquilidade do ponto de vista do emprego, do rendimento e da animosidade das pessoas. Estavam praticamente desanimadas, porque não tinham emprego, não tinham rendimento”.

Para trás, admitiu Cláudio Mendonça, ficam os pedidos que a autarquia todos os dias recebia, inclusive para muitos trabalhadores sem emprego voltarem às ilhas de origem, ou simplesmente de apoio à compra de alimentos ou porque ficaram sem casa, depois da paragem do turismo.

“Agora as pessoas já começaram a reerguer-se e a acreditar efetivamente que o momento é de retoma. O sufoco já passou”, concluiu.

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